SÉRGIO ADORNO
ESPECIAL PARA A FOLHA
O debate no Brasil não é recente. Desde meados dos anos 70 assistimos ao crescimento do crime violento, em especial homicídios cujas vítimas preferenciais são adolescentes e jovens adultos do sexo masculino.
Esse crescimento está relacionado à chegada do crime organizado, sobretudo o comércio ilegal de drogas que se alastrou por bairros populares e centros das cidades.
Na sua esteira, cresceram roubo, assalto a banco, extorsão mediante sequestro.
A repressão violenta tem resultado em inúmeras prisões temporárias, que favorecem a construção de carreiras no crime. Além disso, há envolvimento de agentes policiais em negócios escusos.
Recentemente, reunião de ex-governantes da América Latina retirou o debate -até então restrito a especialistas- de seu confinamento.
A atual política de drogas, tradicionalmente influenciada pela política americana, tem fracassado no propósito de conter o tráfico e o consumo. Ao contrário, tem produzido efeitos bem conhecidos.
A par das disputas fatais pelo controle de pontos de venda, o narcotráfico tem representado séria ameaça para a estabilidade das democracias, notadamente nos países recém-saídos de ditaduras. O narcotráfico funciona à custa da aquiescência daqueles incumbidos de zelar pela aplicação das leis.
A despeito dos argumentos favoráveis, uma política de descriminalização de drogas não pode ignorar problemas. Há consensos quanto aos riscos para a saúde.
É provável que haja picos de consumo abusivo. Nesses casos, jovens de classes superiores terão à disposição clínicas particulares. Mas aqueles das classes de baixa renda dependerão dos serviços do SUS, já sobrecarregado e incapaz de atender às necessidades básicas de saúde no país.
Questões não menos relevantes: quem exercerá o controle sobre produção e distribuição? Será criada uma agência nacional? O Brasil não produz drogas, será então estimulado a fazê-lo para ter maior controle?
Sabemos também, dada a história política desta sociedade, que controles estatais sem lastro na opinião pública dificilmente terão êxito.
Do mesmo modo, campanhas para alertar quanto aos riscos tenderão ao fracasso caso não convençam os potenciais consumidores.
Por fim, uma política nacional não acompanhada pelos países de fronteira, em particular os produtores, poderá tornar o Brasil um território livre para consumo de drogas, com todas as consequências indesejáveis.
Por isso, seria importante melhor conhecer a experiência acumulada em países que relaxaram os controles, como é o caso da Holanda.
O debate, necessário e oportuno, requer pesar todos esses aspectos e evitar tanto as defesas apaixonadas quanto a prisão do moralismo conservador.
Sérgio Adorno, professor titular, é coordenador do NEV-USP, do INCT-CNPq Violência, Democracia e Segurança Cidadã e da Cátedra UNESCO de Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância.
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