Fiz esta entrevista na faculdade em 2008 e considero-a bem interessante:
Nascido na cidade de São Paulo em 1943, Clóvis Rossi é colunista, repórter especial e membro do Conselho Editorial da Folha de S. Paulo. Trabalhou no Jornal do Brasil e foi editor-chefe do Estado de S. Paulo. Teve participação em diversas coberturas internacionais de grande repercussão, tanto pelo Estadão como pela Folha, da qual foi correspondente
Escreveu em sua carreira vários livros sobre jornalismo, entre eles “Vale a pena ser jornalista? (ed. Moderna, 1986), no qual aborda os prós e os contras da profissão dizendo que, “o que há de bom na profissão é essa coisa de poder ser testemunha ocular da história de seu tempo. O que há de ruim é a exigência até irracional de dedicação plena”.
Outro livro que merece destaque é “Enviado Especial-25 anos ao Redor do Mundo”. O livro é uma coletânea de artigos sobre suas coberturas em países e momentos históricos-chaves, como a ditadura Argentina, a Cuba socialista, o conflito entre Israel e Palestina, entre outros.
O jornalista descreve em detalhes o cotidiano das populações destes países, como uma burocrática fila para comprar sorvete em Cuba, a compra desenfreada de máscaras anti-gás em Israel, por receio de um ataque químico vindo do Iraque e a alegria de um comício da esquerda chilena.
Clóvis Rossi considera que o jornalista que trabalha em jornal diário é um batalhador, que “precisa matar um leão por dia”. Aos 44 anos de profissão, diz que tem pela frente umas dez mil batalhas, todas interessantes, em grandes assuntos, mas também em pequenos pés-de-página.
Entrevista :
Aurelio Moraes
Em 1999 você lançou o livro "Enviado Especial-25 anos ao redor do mundo". Como surgiu a idéia de criar este livro?
Clóvis Rossi – Amigos meus antigos é que insistiram que valia a pena fazer uma compilação de textos publicados ao longo do tempo.
Qual a maior dificuldade e o maior prazer de ser um correspondente internacional?
R – A maior dificuldade é ter acesso à fontes, porque, naturalmente, elas preferem atender a mídia local. O maior prazer é poder olhar o bosque inteiro, e não apenas as árvores como acontece quando você trabalha no teu próprio país, já que há sempre outro repórter do teu jornal olhando as outras árvores.
É fácil conseguir investimento das editoras neste gênero?
R – Não, é difícil. Este tipo de livro tem um público muito segmentado, portanto muitas editoras relutam em publicar este gênero.
Quais são os primeiros passos para um jornalista iniciante escrever um livro-reportagem?
R – Primeiro, seria bom escrever reportagens até ficar bom nisso, antes de pensar em livro-reportagem.
No seu livro há uma coletânea de textos sobre suas coberturas no Chile, na Argentina, em Portugal e em outros países. Qual destas coberturas te marcou mais?
R – Cada uma delas em seu momento, mas eu destacaria o drama da falta de liberdade política em Cuba e a luta das mães dos presos políticos na Argentina.
Você esteve em Cuba, em 1977. Em sua opinião o regime socialista cubano ainda influencia muito a esquerda latino-americana? Você acha que Raúl Castro simboliza uma possibilidade de grandes mudanças políticas no país?
R – Influencia cada vez menos e isso é bom. Não seria bom vermos mais “Hugos Chávez” em nosso continente. Sobre Raúl Castro, vejo como inócua a liberação da compra de eletroeletrônicos para a população. O que eles precisam é de liberdade política em primeiro lugar, e não celulares.
Vamos falar um pouco da política nacional atual. No governo Lula temos visto vários problemas de ética. É o uso de cartão corporativo, o dossiê e outros imbróglios. Você acha que a imprensa tem acompanhado bem estes casos?
R – De modo geral, sim. Receio que deve ficar claro que cada jornal tem sua linha editorial, que pode dar em cada caso um enfoque diferente. O fato é que o governo parece uma máquina de arranjar problemas. E estes certamente viram notícias.
Na sua visão a imprensa cobre o governo Lula da mesma forma que cobria o governo FHC?
R – Não acho que exista imprensa como um todo homogêneo. A Folha é diferente da Rede Globo, que é diferente do Estadão e por aí vai. Logo não dá para responder de forma generalizada. Não faz sentido por exemplo o PT se sentir “perseguido” pela imprensa. Na época do FHC tudo era noticiado também.
Em sua coluna do dia 21 você fala sobre o espetáculo no qual se tornou o caso Isabella Nardoni. Você acha que a culpa disto são os próprios jornais ou a própria demanda do público-leitor, que se fascina com o caso?
R – A culpa maior, como escrevi, é da polícia que vaza informações antes de investigar. Esta execração pública beira a barbárie que podemos atribuir às informações vazadas de forma imprudente.
Na sua coluna do dia 31 de outubro de 2007 você comentou a escolha do Brasil como país-sede da Copa de 2014. Acha que o país tem preparo para sediar uma Copa? Quando a escolha foi anunciada, poucas vozes ecoaram na imprensa mencionando as possíveis dificuldades da realização de uma copa no Brasil.Ao que você atribui todo este oba-oba que foi feito pela imprensa?
R – Vimos em alguns veículos um clima de festa generalizada, mas ainda bem que o vírus da euforia não contaminou a todos. Eu, que cobri a escolha, não fiz um “oba-oba”. Nem o conjunto de textos da Folha.
Como você acha que está o mercado jornalístico atualmente, para quem sai da faculdade?
R – O estudante de jornalismo deve sair um pouco da “glamourização da profissão”. Nem sempre o primeiro emprego é aquele que a gente mais cobiça. No início da carreira vale até trabalhar em um pequeno jornal de bairro, principalmente para adquirir experiência.
Nos cursos de jornalismo ainda se debate muito a questão do jornalismo ser um 4º "poder". Você acha que é?
R – Não é nem nunca foi. O jornalismo pode influenciar os desdobramentos da sociedade, mas está longe de ser um “poder”.
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