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domingo, 3 de janeiro de 2010

Um pouco de história antiga das religiões

Existem bons livros sobre como os mitos religiosos foram sendo construídos. Os trechos abaixo serão reconhecidos pelo leitor como presentes em religiões mais atuais:




Por fim os deuses se tornaram humanos – ou, antes os homens se tornaram deuses. Como as deidades da Grécia, os deuses humanos do Egito eram superiores aos homens e às mulheres, concebidos em moldes heróicos, mas sempre de carne e osso; tinham fome e comiam, tinham sede e bebiam, amavam e se acasalavam, odiavam e matavam, envelheciam e morriam. (G. Maspero, Dawn of Civiization, 101-1). Temos, por exemplo, Osíris, cuja morte e ressurreição eram celebradas todos os anos como símbolos da enchente e da vazante do Nilo. Cada egípcios das últimas dinastias cantava a história de como Set, o perverso deus da seca, encolerizou-se com Osíris por derramar com a enchente a fertilidade sobre a terra, e matou-o, e reinou sobre o dessecado reino de Osíris (isto é, sobre a terra privada duma enchente que não veio) até que Hórus, valente filho de Ísis, o derrubasse e banisse; e então Osíris ressuscitou ao calor do amor de Ísis e governou benevolentemente o Egito, suprimiu o canibalismo, estabeleceu a civilização e subiu ao céu para reinar eternamente como deus. (J. H. Breasted, Development of Religion and Thought in Ancient Egypt, 24,33; J. G. Frazer, Adonis Attis Osiris, 269-75; 383.) Equivale a um mito profundo; porque a história, assim como a religião oriental, é dualística – um relato de lutas entre a criação e a destruição, entre a fertilidade e a seca, entre a mocidade e a velhice, entre o bem e o mal, entre a vida e a morte.



Profundidade também vemos no mito de Ísis, a Grande Mãe. Não significava apenas a leal irmã e esposa do Osíris; em certo sentido o superava em grandeza, porque – como as mulheres em geral – havia vencido a morte por meio do amor. Nem era apenas o solo negro do Delta, fertilizado pelo toque de Osíris; era acima de tudo símbolo da misteriosa força criadora de todos os seres vivos e maternal ternura que amamenta as vidas novas. Ísis representava no Egito – como Cali, Ishtar e Cibele na Ásia, Deméter na Grécia e Ceres em Roma – a prioridade e a independência do princípio feminino em criação e transmissão hereditária, e a original função inicial da mulher na agricultura; foi Ísis (diz o mito) quem revelou a Osíris (o homem) o trigo e a cevada nativos no Egito. (Deodoro Sículo, I, XVI, 1.) O povo adorava-a com especial ternura e erguia-lhe imagens, considerava-a a Mãe de Deus; seus tonsurados sacerdotes exaltavam-na em sonoras matinas e vésperas; e no meio do inverso, coincidente com a anual ressurreição do sol, os tempos de Hórus, seu divino filho e deis do sol, mostravam-na num estábulo, amamentando um bebê miraculosamente concebido. Essas lendas poético-filosóficas afetaram profundamente o cristianismo. Os primitivos cristãos muitas vezes se curvaram diante das estátuas de Ísis com o infante ao seio, vendo nelas outra forma do velho e nobre mito pelo qual a mulher (isto é, o princípio feminino), criando todas as coisas, se tornou por mim a Mãe de Deus. (Frazer, Adonis, 346-50; G. Maspero, Dawn of Civiization, 131-2; Macrobius, Saturnalia, I, 18, in McCabe, Jos., Story of Religious Controversy, 169). (p.210-211).


Trechos do livro "História da Civilização", de Will Durant.

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