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sexta-feira, 9 de novembro de 2012
Na falta de troco, comércio deve arredondar preço para baixo
A conta na padaria ou no supermercado deu quebrada e, na hora do troco, o cliente recebe uma bala ou chiclete, em vez de dinheiro, ou fica sem os três ou quatro centavos que sobraram porque o caixa arredonda o valor da compra para cima. Apesar desta prática ser condenada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), clientes de padarias e supermercados reclamam que a ocorrência é comum.
— Sempre querem ficar com os meus centavos. Mas eu reclamo. Mesmo se for por um centavo. De um em um eles faturam muito em cima dos outros — diz Solange Ribeiro, de 53 anos, cliente de uma padaria de Copacabana.
Afrânio Leal, 82, costuma frequentar a mesma mercearia há mais de 40 anos, também em Copacabana, e diz que já nem liga mais quando recebe bala de troco, pois os doces fazem a alegria dos dois netinhos que moram com ele. Mesmo assim, não acha justo:
— Se falta troco, o problema não é do cliente. O dono é quem tem de dar um jeito nisso.
Supermercadistas e donos de padarias alegam que, principalmente as moedas de um centavo estão escassas, e que isso dificulta o troco. Porém, tanto o presidente executivo da Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj), Aylton Fornari, quanto o presidente da Associação dos Industriais de Panificação e Afins do Rio (Abipan), José Severiano Câmara, garantem orientar aos associados a, na falta de troco, arredondarem para baixo o valor da compra.
— Dar troco em balas ou chicletes é uma prática ilegal, pois o consumidor vai ao estabelecimento querendo adquirir algum produto e, na hora de receber o troco, o certo é que ele receba em dinheiro para que possa comprar algum outra coisa posteriormente — analisa o advogado do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) Guilherme Varella.
Segundo Varella, ao agir desta forma, o estabelecimento fere o (CDC) porque deixa o cliente em “desvantagem exagerada no mercado”.
— Essa prática pode ser vista até mesmo como enriquecimento ilícito no caso de acontecer com frequência ou em grande proporção, pois o estabelecimento estaria lucrando indevidamente às custas do patrimônio alheio, do consumidor. Além disso, pode ser considerado um tipo de venda casada, pois o consumidor quer aquele produto e, devido à falta de troco, é obrigado a levar também uma outra coisa, como uma bala — esclarece o advogado.
Estas duas práticas são proibidas pelo artigo 884 do Código Civil (enriquecimento ilícito), e artigo 39, parágrafo 1° do do CDC (venda casada).
Falta de troco deve ser denunciada ao Procon
Não existe regulamentação específica relacionada aos preços quebrados nos estabelecimentos. Mesmo com a escassez das moedinhas de um centavo, o que vale é a livre iniciativa dos fornecedores na hora de estipular os preços. No entanto, caso opte por estabelecer preços quebrados (por exemplo: R$ 1,99, R$ 499,98), é responsabilidade do comerciante providenciar dinheiro em quantias pequenas para suprir a necessidade que surge com a compra de mercadorias, de forma que o consumidor possa receber o troco sem problemas, esclarece Varella.
— No caso de taxistas ou estabelecimentos comerciais não terem dinheiro trocado, é direito do consumidor que a conta seja arredondada para baixo até que o fornecedor tenha o valor necessário para suprir a demanda de troco — complementa.
A regra, portanto, é o fornecedor do serviço ou comerciante sempre arredondar o valor para baixo, mesmo que o preço termine com os decimais 7, 8 e 9. Por exemplo: se o produto custa R$ 1,97, ele deve ser arredondado para R$ 1,95 ou R$ 1,90, até chegar no troco, nunca para R$ 2,00. Caso o estabelecimento aumente para cima, o que estará acontecendo é aumento de preço sem justa causa, o que também é proibido pelo artigo 39, do CDC.
No caso de um estabelecimento não disponibilizar o troco, o consumidor deve denunciá-lo ao Procon da cidade onde mora, orienta o advogado.
Preços quebrados têm efeito psicológico
De acordo com o economista Gilberto Braga, professor de Finanças e Gestão do Ibmec-RJ, os comerciantes preferem utilizar preços quebrados para induzir o cliente de que o valor é menor do que realmente custa.
— Por exemplo, uma produto cujo o preço seja de R$ 9,95 a R$ 9,99 custa na prática R$ 10, porque o valor é baixo e o consumidor tende a pagar em dinheiro vivo. Como o comerciante não vai ter a moedinha para dar o troco, a transação acaba sendo efetivada por R$ 10.
Desta forma, até o cliente acaba se convencendo de que um troco de até cinco centavos não vale muito, explica o economista:
— Se o comerciante se desculpar por não ter o troco certo o cliente não vai deixar de adquirir o produto, o que é a prova de que se o comerciante tiver o troco tudo bem, se não tiver os cinco centavos também. A pergunta é: o consumidor compraria o produto se ele custasse na etiqueta R$ 10?
Produção da moeda foi reduzida a partir de 2005
Segundo o Banco Central (BC), há quase 3,2 bilhões de moedas de um centavo em circulação. No entanto, a produção foi reduzida a partir de 2005, quando um volume superior a 3 bilhões (cerca de 16 moedas per capita) foi atingido. O BC argumenta que a decisão foi tomada a partir de pesquisas feitas junto à população, na qual identificou que a moeda neste valor teve o menor índice de citação no quesito “Valores de moedas que sente falta no momento que precisa fazer um pagamento”.
Além da falta de demanda, o BC levou em consideração o custo para produção da moeda, que é de 16 centavos por unidade. Por isso, “decidiu-se pela priorização da produção de moedas das outras denominações”, informou o banco em nota. No entanto, não descarta “se o BC perceber que é necessário voltar a produzir, isto poderá ser feito”.
Para o economista Gilberto Braga, a moeda de um centavo está em escassez na economia por três razões. Primeiro, pelo hábito que pessoas têm de guardar as moedas em cofrinhos, ou esquecê-las em consoles de veículos e porta-lápis, simplesmente por as considerem incômodas.
Depois, ainda existe o custo para produzi-las, que pode ser maior que o valor delas no mercado e, por último, existe a perda do valor relativo da própria moeda, em função do aumento de preços praticados no mercado.
O Globo
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