Novas regras, em vigor há dois anos, prometiam melhora no atendimento
Companhias recorrem de multas na Justiça e nada pagaram na esfera federal; ações coletivas não deram resultado
LORENNA RODRIGUES
DE BRASÍLIA
Mais de dois anos depois de terem sido anunciadas, as regras para melhorar o atendimento nos serviços de call centers continuam sendo descumpridas, agora com um agravante: multadas, as empresas não pagaram nenhum real por isso até agora.
Só na esfera federal, as empresas reguladas de setores como telefonia, financeiro e transporte aéreo e terrestre foram multadas em R$ 18,6 milhões por desrespeitar o decreto que regulamentou o SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor).
Levantamento feito a pedido da Folha pelo DPDC (Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor), do Ministério da Justiça, mostra que nada foi pago até agora.
Amparadas pela legislação, as empresas recorrem administrativamente dentro do ministério, onde invariavelmente não encontram sucesso, e depois à Justiça, protelando o pagamento.
As regras mais rígidas anunciadas em dezembro de 2008 prometiam o fim das esperas intermináveis dos consumidores e o cancelamento imediato dos serviços.
DANO COLETIVO
Inconformado com a falta de efetividade das multas, o DPDC ingressou em 2009 com duas ações por danos morais coletivos contra duas das empresas mais reclamadas (Oi e Claro), pedindo R$ 300 milhões de indenização em cada caso.
As ações, porém, ainda não foram julgadas nem na primeira instância.
A diretora do DPDC, Juliana Pereira, ressalta que cada multa é resultado de processo aberto a partir de reclamações de vários consumidores em Procons e que o órgão busca provas contundentes para basear as punições.
"Não abrimos processos sem termos fortes indícios. São asseguradas a ampla defesa e o contraditório", diz.
ESTADOS
Nos Estados, a situação se repete e a maioria das multas aplicadas pelos Procons também não foram pagas.
Em São Paulo, as multas por descumprimento das regras do SAC somam R$ 47 milhões, dos quais apenas R$ 330 mil foram pagos. Outros R$ 30 milhões estão sendo questionados na Justiça.
Segundo o último balanço do DPDC, obtido pela Folha, a maioria dos consumidores que recorrem aos Procons se queixa de dificuldade em cancelar serviços, problemas para contatar a empresa e falta de resolução de demanda.
Na liderança das multas estão a Oi, com R$ 3,24 milhões, Gontijo Transportes, com R$ 2,55 milhões, e Claro, com R$ 2,02 milhões.
ANÁLISE SERVIÇOS
Só o peso das sanções fará empresas cumprirem a lei dos call centers
Companhias conseguem adiar o pagamento de multas e novos prazos não são estipulados
PROCONS DEVEM FISCALIZAR PARA REVERTER A ATUAL SITUAÇÃO E JUÍZES PRECISAM PUNIR AS INFRAÇÕES QUE SÃO COMETIDAS
MARIA INÊS DOLCI
COLUNISTA DA FOLHA
A regulamentação dos Serviços de Atendimento ao Consumidor (SAC) entrou em vigor com pompa e circunstância, há dois anos.
Afirmava-se que nada seria como antes. O consumidor, finalmente, seria bem atendido, com respeito e eficiência. Ou os infratores teriam que arcar com pesadas multas.
Normalmente, porém, o que faz as coisas mudarem em qualquer lugar do mundo, salvo exceções, é o peso das sanções para quem não cumprir a lei.
Aqui não seria diferente, se as multas fossem pagas.
Não o são, porque basta a empresa ingressar em juízo contra a cobrança que sempre consegue adiar, sem data, o pagamento.
Se a irregularidade e o arrepio à lei não são punidos, bem, por que mudar?
Claro, houve muitas empresas que investiram pesadamente para se adequar. Contrataram mais profissionais, adquiriram softwares, computadores e melhoraram a telefonia. Capacitaram suas equipes de atendentes.
Os Procons fizeram muito bem sua parte. Fiscalizaram, ligando de surpresa para verificar se companhias cumpriam o que estava estabelecido na regulamentação.
Verificaram, por exemplo, se era cumprida a regra de ser atendido por uma só pessoa (sem o jogo do empurra).
Mas as empresas reguladas, de bens essenciais, sem concorrência, são a maioria das que não levaram a regulamentação dos SACs a sério.
E não se assustaram com as pretensas multas.
Um bom exemplo do que não tem sido cumprido: no capítulo 4 da lei, sobre o acompanhamento de demandas, determina-se que as gravações das chamadas ao SAC sejam mantidas por um período de três meses.
E que o registro eletrônico do atendimento fique à disposição do consumidor e de entidade fiscalizadora por, no mínimo, dois anos após a solicitação da demanda.
Mas o consumidor pede as gravações e não as recebe, sob alegações diversas. Uma das medidas necessárias para mudar esse quadro seria sensibilizar os juízes para a importância de punir quem desrespeita os direitos do consumidor.
Isso, contudo, depende de tempo, de um trabalho prolongado de conscientização e educação.
De qualquer forma, somente com Procons fortes poderemos reverter a transformação da lei dos SACs em letra morta.
MARIA INÊS DOLCI, 54, advogada formada pela USP com especialização em business, é especialista em direito do consumidor e coordenadora institucional da ProTeste Associação de Consumidores.
Tentar reclamar sobre um serviço mal prestado ou cancelar uma assinatura é um martírio. Funcionários despreparados, com péssima dicção e com graves problemas de português, longo tempo de espera, jogo de "empurra" de um ramal para o outro etc.
Agora,a moda é colocarem mensagens pré-gravadas. Por exemplo, há falta de luz na sua casa e você liga para a companhia de energia, que faz você ouvir uma gravação afirmando que "há um problema na região e o tempo estimado para a volta da energia é de X horas", com o detalhe de que nunca cumprem o prazo estipulado e a ligação cai após a mensagem, sem você ter a chance de reclamar com um atendente. Já ouvi uma mensagem assim também após a queda do sinal do meu Speedy. Recomendo aos amigos que quando passarem por um constrangimento destes, reclamem logo com o Procon, relatando que foram cerceados do direito de reclamar com as operadoras.
Você acha que na Espanha, país-sede da Telefônica, o serviço é tão ruim assim? Não é, pois lá todos sempre reclamam e duras penas são impostas às empresas que não respeitam os consumidores.
Espero que todas estas empresas sejam punidas exemplarmente, o mais breve possível.
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