Minha amiga M.Y. se especializou em pegar aquele tipo de homem noturno e boêmio que não economiza nos tragos e, invariavelmente, retorna para o rancho sem condições técnicas para a conjunção carnal ou qualquer abofelamento que possa se chamar de sexo. São os melhores, ela prega: a excelência, o suprassumo, o filé em matéria de abate e diversão em tempos modernos. A este ser avulso e simpático que faz a ronda dos bares deu-se o batismo de homem-tupperware.
A desalmada M.Y., típica predadora do ciclo do macho perdido, nos explica a terminologia adotada no folclore baladeiro: trata-se do sujeito que a gente guarda no final da noite para comer na manhã seguinte. O homem-tupperware, ela diz, com toda a sinceridade desse mundo, é o novíssimo Casanova, um monstro na cama, um demônio, desde que seja respeitado no seu intocável estado de porre. Ele desperta com a fúria dos grandes e imbatíveis amantes, relata a moça, ainda com os lábios febris a derreter o gloss da tara e do desejo.
O macho desse gênero é uma dócil criatura que não dá quase trabalho, prossegue a bela afilhada de Balzac, um mulherão para 300 talheres. Segundo M.Y., esse tipinho de homem se encontra ali na faixa dos 40 ou mais, já foi casado ou se trata de um solteiro convicto e não vai grudar na barra da sua saia como faria um imaturo homem mais jovem.
O sujeito que se guarda como a um bom fiambre no tupperware, reforça a amiga, é um homem quase perfeito: apaga assim que deita na cama, portanto não corre o risco de desfiar besteiras ou tecer falsas promessas. É praticamente um homem sem mentiras, o que se torna um épico em se tratando da raça, diz M.Y., com mais uma demão nas suas peculiares tintas do exagero.
A criatura do gênero nem sempre percebe a sua condição de presa guardada para o abate matinal. A não ser os profissionais do ramo, figuras menos machistas que flanam pela noite com o desapego e o lirismo de um poeta do século 19. Estes adoram e ainda fazem sonetos, com odes ao acaso, enquanto a predadora ingere sua inocente tigelinha de iogurte com cereais.
Para M.Y., é bom que se frise, pouco importa se o tal sujeito tem pendores românticos ou não passa de um tosco que usa apenas 10 por cento da cabeça animal. O que vale é a serventia da presa, ri a desgraçada, enquanto mapeia a geografia boêmia para os próximos ataques como um tubarão recifense que mira as canelas dos surfistas mais cevadinhos de Boa Viagem.
Sim, a amiga especialista reconhece: com a lei seca no volante diminuiu um pouquinho, um pouquinho de nada mesmo, o número de homem-tupperware dando sopa nos bares e botecos. Esse tipo de macho, além de prevenido, tem uma confiança danada no próprio taco – já sai de casa dando como certa a carona do bonde chamado desejo.
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