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segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Onde foram gastos os R$ 20 milhões de “Nosso Lar”?

(Outra crítica ao filme, muito boa, de Maurício Stycer)




Anunciada como uma das produções mais caras da história do cinema brasileiro, talvez a mais cara, “Nosso Lar” transpõe para as telas o maior best-seller do médium Chico Xavier, no qual ele relata uma história que lhe teria sido ditada pelo espírito de André Luiz, um médico que viveu no Rio de Janeiro de Janeiro no início do século 20.
É uma obra de iniciação ao espiritismo. Descreve alguns episódios da vida de André Luiz – sua morte, a sofrida temporada no umbral, “uma espécie de purgatório”, onde é acusado de ter cometido suicídio, e a chegada do socorro espiritual, que o transporta, numa maca, para uma dimensão superior, a colônia Nosso Lar.
O câncer no intestino que causou a morte do médico, na verdade, foi a forma visível do suicídio que ele cometeu, explica o ministro da Regeneração. Todos os sentimentos negativos que ele alimentou em vida o mataram – eis a primeira lição.
Há outros 71 ministros no Nosso Lar, uma cidade que parece construída por Oscar Niemeyer em uma viagem de LSD. Vamos conhecer alguns, cada um com lições a ensinar a André Luiz sobre vida, morte e reencarnação. Por exemplo: “O bem que fazemos é nosso advogado na eternidade”. Ou então: “A vida na Terra é que é cópia daqui”. Ou ainda: “A reencarnação é a melhor escola”.
“Nosso Lar” também se esforça em ensinar como o espiritismo é acolhedor e sem preconceitos religiosos – numa longa cena, mortos com uma estrela de Davi bordada na roupa, possivelmente vítimas de campos de concentração nazistas, são recebidos à entrada da colônia por ministros e devotos.
Diferentemente de “Chico Xavier”, de Daniel Filho, destinado basicamente a agradar os fiéis, “Nosso Lar” tem, claramente, uma preocupação de formação. É cinema falado. Ou um livro ilustrado com imagens e sons (com direito a trilha sonora de Philip Glass). Didático, o filme apresenta o espiritismo e o explica em detalhes, além de se permitir poucos momentos de emoção ou pieguice.
O mais curioso é justamente a informação de que o filme custou R$ 20 milhões, um valor obtido quase integralmente sem recorrer a renúncia fiscal. Passei boa parte da sessão tentando entender onde “Nosso Lar” gastou os seus recursos. Na cenografia de mau gosto? No roteiro verborrágico? Nos figurinos simplórios? No enorme elenco de poucas estrelas? Na trilha sonora (nada) original de Glass? Nos magros efeitos especiais?
No conjunto de seus esforços, “Nosso Lar” não vai desapontar os espíritas e é capaz, no mínimo, de arregimentar simpatia para a causa. É provável, ainda, diante da corrida do público aos cinemas, que não desaponte os seus investidores. Mas não poderá nunca dizer que é cinema de qualidade.

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