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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Plantas que dão luz. Milagre da Física?



Sim, pois é isso que a reportagem da Folha, cujos competentíssimos repórteres, em matéria cedida pela Reuters, nos trouxeram. Segundo eles, um cientista do Centro de Pesquisa em Ciência Aplicada de Taiwan, apresentou à imprensa o resultado de um experimento que mistura nanopartículas de ouro e água a plantas. O resultado? A planta começa a emitir luz. Sim! Isso mesmo: sem nenhum custo ou consumo de energia.
Bem, pelo menos é o que os jornalistas pensaram e, pior!, escreveram. E o que é similar a um jornalista escrevendo sobre Ciência?
A matéria intitulada "Pesquisadores de Taiwan misturam ouro a planta para gerar luz", já é um acicate a qualquer estudante mediano de Termodinâmica. Então, basta adicionar ouro à planta que ela fica acesa que nem árvore de Natal, mas sem as lampadazinhas? Sei.
Segundo a notícia,
Segundo o estudo, essas substâncias fazem com que as plantas produzam clorofila e suas folhas emitam luz.
A longo prazo, os pesquisadores apostam que as plantas possam substituir a tradicional iluminação de rua, produzindo, ao mesmo tempo, um novo tipo de energia limpa.
Ahan. Claro, claro. Senão, vejamos: Ouro + Água + Planta —-> Clorofila + Luz. Olha, eu não sei onde o jornalista estudou, mas com certeza não foi num colégio. Depois, esse pessoal estufa o peito ao dizer "Sou jornalista diplomado". Grandes merdas! O que se aprende na facurdadi de jornalismo? Com certeza, nada sobre Ciências de ensino fundamental (mais especificamente, 7º ano, antiga 6ª série).
Acontece, senhores jornaleiros, digo, jornalistas, plantas não possuem clorofila. Cloroplastos é que possuem. Cloroplastos são organelas dentro das células que num passado remoto eram algas azuis que passaram a viver em endossimbiose com as primeiras plantas fotossintezantes. O que são algas azuis? O que é endossimbiose? Para isto existe algo chamado "escola". Frequentem uma.
Não satisfeito com esta IMENSA besteira, fui buscar a origem da pesquisa que — ora vejam! – data de 22 outubro de 2010. valeu, Folha! Notícia em cima dos acontecimentos. Como eu sei a data? Simples, eu vi o blog da própria instituição onde o dr. Su Yen-Hsun. Culpa da Folha? Mais ou menos, ela apenas pagou pela reportagem feita pela Reuters. Logo, os nossos jornalistas iguais ao jornalismo mundial. Exceto aqui, em Tuvalu, onde os repórteres sempre pesquisam muito antes de escrever qualquer coisa. Fica fácil quando só se tem um jornal e pouca coisa pra se falar daqui. Visitem Tuvalu, e se aparecerem por aqui, me deixem em paz e mantenham distância.
Mas, afinal, o que foi descoberto? Bem, segundo a notícia da fonte original (e não estou falando da Reuters), a clorofila apresenta quimioluminescência (e não bioluminescência, senhorita Yuandi Li). NA verdade o termo "bioluminescência só seria válido se através de reações químicas vitais se produzisse luz (para saber mais, acesse este PDF). No caso da clorofila, é uma peculiaridade de sua estrutura química, independendo de ela estar num corpo vivo ou em meio a um processo metabólico. Se você banhar um estrato de clorofila com luz ultra-violeta, que é invisível (a lâmpada UV que você compra em loja de material elétrico é roxa para você perceber que a lâmpada está ligada, mas você, humano idiota, NÃO ENXERGA emissões eletromagnéticas na faixa de onda que compreende as emissões ultra-violetas e acima), a clorofila receberá esta energia radiante e emanará energia radiante num comprimento de onda visível ao olho humano.
Com o uso de nanopartículas de ouro em plantas da espécie Bacopa caroliniana, o dr. Su Yen-Hsun foi capaz de induzir a clorofila nas folhas para produzir uma emissão no comprimento da radiação eletromagnética de cor vermelha, que possui grande comprimento de onda e baixa energia. Isso significa, para meu alívio, que as duas leis da termodinâmica não foram violadas. Em primeiro lugar, ao contrário do que a reportagem da Reuters deu a entender, nem a energia luminosa nem a clorofila apareceram do nada; é a Lei da Conservação da Energia. Em segundo lugar, parte da energia radiante captada pela planta foi absorvida, emitindo fótons de menor quantidade de energia (luz vermelha), fazendo jus ao fato da Segunda Lei da Termodinâmica dizer que não existe evento onde a energia possa ser 100% aproveitada.
Outro ponto a ser analisado é que o ouro age como catalisador, ele não cria nada. Ele apenas otimiza a emanação da luz, sem que haja cintilações, sendo o fluxo constante e ininterrupto. Se apenas se usasse "ouro" (em quantidades não determinadas, mas em escala considerável), teríamos um problema no tocante ao custo, além do fato que a extração de ouro requerer muitas vezes o emprego de mercúrio, o que não é tão legal pro ambiente.
Como conhecimento, é importante, mas penso que seja inviável economicamente usar este tipo de planta (que por sinal é uma planta aquática) para iluminação. A energia solar é em enorme quantidade e gratuita, mas o seu uso ainda é caro, dada a baixa eficiência perante nossa tecnologia atual. Claro que sendo abundante e totalmente gratuita, isso não é empecilho, mas daí a dizer que colocar pó de ouro em plantinhas para produzir clorofila e luz, vai uma grande diferença. A diferença que separa realidade da ignorância científica.

Ceticismo.net

É incrível como existem jornalistas sem o mínimo de conhecimento científico. Palpiteiros deste calibre não deviam ser colocados para cobrir áreas as quais eles são completos apedeutas. Em minha faculdade, tive uma disciplina de jornalismo científico, que infelizmente não está disponível em todos os cursos da área. Depois, colocam um incompetente sem a menor capacidade de fazer pesquisa científica para fazer ou copiar uma matéria de maneira incompleta, como neste caso da Folha. Lamentável.

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