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terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Cannabis (maconha) e o Fígado

Dr. Stefano Gonçalves Jorge

Chamou a minha atenção o fato de que o uso da cannabis (maconha) estaria sendo defendido como benéfico na hepatite C, especialmente por diminuir os efeitos colaterais do tratamento com interferon, que podem ser debilitantes e levar a redução na dose ou na suspensão da medicação, reduzindo portanto a probabilidade do paciente alcançar a resposta virológica sustentada.

Não faz parte do perfil deste site defender ou condenar a legalização da maconha, discutir se essa droga é realmente uma porta de entrada para outras "mais pesadas" ou sobre os seus riscos neuropsiquiátricos. Esse breve artigo se refere exclusivamente ao seu uso medicinal em doenças do fígado e suas conseqüências no órgão.






Há pelo menos um estudo mostrando benefício do cannabis na maior tolerância aos efeitos colaterais do interferon, o que levaria a maior aderência e, portanto, aderência e eficácia ao mesmo. Mas esse estudo (1) foi realizado em portadores de hepatite C que já eram usuários do cannabis antes de iniciar o tratamento. Isso não significa que os mesmos efeitos serão observados em portadores que não utilizavam a droga anteriormente.

Além disso, o cannabis e canabinóides podem levar a lesão hepática. Isso pode ocorrer por estímulo dos receptores de canabinóides hepáticos, que são praticamente ausentes no fígado normal, mas que são progressivamente mais presentes ao longo de doenças hepáticas crônicas. A ativação desses receptores tem ação profibrogênica por estímulo das células esteladas, altera o metabolismo energético induzindo ao acúmulo de triglicérides no fígado (fazendo parte da fisiopatogenia da esteatose hepática e esteato-hepatite) e pode causar vasodilatação hepática (2-5).


Na cirrose hepática, o sistema endocanabinóide (estimulado pelo cannabis) pode contribuir para a encefalopatia hepática e alterações vasculares, incluindo vasodilatação do sistema esplâncnico e hipertensão portal (responsáveis pelas varizes esofágicas e parte da fisiopatogenia da ascite e da síndrome hepatorrenal) e possivelmente contribuindo para a cardiomiopatia cirrótica (5).

O cannabis, portanto, não está recomendado durante o tratamento da hepatite C, pois consiste em fator de risco adicional para a gravidade da doença (6,7). Além disso, o seu uso estaria contra-indicado em portadores de doenças hepáticas e, nas situações onde o seu uso medicinal está indicado (em casos selecionados de glaucoma, por exemplo), deveria haver monitoramento periódico de marcadores de lesão hepática durante o seu uso.

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