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quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Proteja seu filho de mensagens comerciais disfarçadas



Sempre quis ter filhos um pouco desconfiados, ao menos no que diz respeito a propagandas e ao proselitismo. Em outras palavras, sempre quis que meus filhos crescessem atentos ao discurso cuidadoso e bem estudado de pessoas que queiram ganhar sua confiança, mas que não são realmente seus amigos.
Cresci em uma época na qual a TV era dominada por propagandas de cigarro. Eu me lembro de todos os jingles, mas também me lembro do cinismo das paródias da revista "Mad", nas quais lápides discutiam o sabor de cigarros e Hitler dava seu selo de aprovação a esses assassinos em massa.

Nas discussões mais sérias sobre as propagandas dos dias de hoje, às vezes sinto falta desse humor cruel. Há muito tempo pesquisadores se concentram nos efeitos das propagandas de cigarros e de álcool sobre as crianças e, mais recentemente, nos efeitos de formas de marketing mais sutis, que incluem esse tipo de produto em filmes e programas de TV.

Estudos mostram que as propagandas realmente levam crianças e adolescentes a adotarem comportamentos pouco saudáveis, além de demonstrarem que é cada vez mais difícil protegê-las, uma vez que os marqueteiros exploram cada vez mais a internet e as mídias sociais.

Em um estudo publicado no mês passado pela revista "Pediatrics", o pesquisador da Universidade de Claremont Jerry L. Grenard e seus colegas acompanharam quase 4.000 alunos do sétimo ao décimo ano, avaliando sua exposição a propagandas de álcool na TV e os questionando sobre o consumo de bebidas alcoólicas.

Uma extensa literatura mostra que a propaganda realmente aumenta as chances de que menores de idade bebam, afirmou Grenard. Contudo, os novos resultados aumentam a preocupação. "O estudo ligou a exposição a propagandas de bebidas alcoólicas a um aumento no uso de álcool entre adolescentes, que por sua vez está ligado a um maior índice de problemas com alcoolismo, bebedeiras, faltas escolares e brigas", afirmou.


Adolescentes que assistem a propagandas de bebidas alcoólicas são convidados a consumir algo que deveriam evitar a todo o custo. Por outro lado, anúncios de alimentos levantam outras questões, já que as crianças certamente vão comer e certamente terão –e expressarão– preferências alimentares.

Jennifer Harris, diretora de campanhas de marketing do Centro Yale Rudd de Políticas Alimentares e Obesidade, contou-me que as propagandas na TV ainda são muito importantes para a forma como os alimentos são vendidos para crianças. De acordo com dados do centro, crianças e adolescentes dos Estados Unidos veem uma média de 12 a 14 anúncios de comida na TV todos os dias.

Mas os pais talvez não percebam que seus filhos estão sujeitos a mensagens comerciais vindas de outras direções. "As empresas têm sites com programas de recompensa. Fazem propagandas em sites, mídias sociais –especialmente no Facebook –, no Twitter, pelo celular e em aplicativos para aparelhos móveis", afirmou Harris.

Na internet, muitas crianças acessam propagandas disfarçadas de jogos, criadas para promover produtos. Segundo a especialista, muitos pais nem ficam sabendo disso. E o que estão vendendo para as crianças? De acordo com Harris, os quatro produtos mais vendidos são lanches, cereais açucarados, refrigerantes e doces.

Thomas Robinson, professor de pediatria na Universidade de Stanford e no Hospital Infantil Lucile Packard, estudou a obesidade infantil e sua ligação com o tempo passado em frente à TV. Segundo ele, experiências com alunos em idade pré-escolar mostram que "até mesmo uma exposição de 30 segundos a um produto nunca antes visto pode mudar suas preferências em relação à marca".

Em outro estudo, pesquisadores observaram os efeitos das marcas ao dar duas porções de alimentos idênticos a crianças de três a cinco anos de idade. Uma das porções estava embalada com papel do McDonald's e as crianças deveriam apontar qual das duas era mais saborosa. Segundo Robinson, "as crianças diziam na esmagadora maioria das vezes que hambúrgueres, batatas fritas, cenourinhas e copos de leite ou suco com a embalagem do McDonald's eram mais gostosos".



Até a idade de sete ou oito anos, as crianças não são capazes de entender a natureza da propaganda. Do ponto de vista do desenvolvimento, ainda não são capazes de identificar as intenções por trás dos comerciais. Outras crianças os entendem melhor, mais também são vulneráveis de outras formas.

"A Coca-Cola é a marca mais popular do Facebook", afirmou Harris. "Eles têm mais de 58 milhões de fãs." Quando os adolescentes "curtem" a Coca-Cola, recebem posts todos os dias e podem "compartilhá-los" com seus amigos.

"Acreditamos que a estratégia de contar com a influência mútua das crianças dessa idade seja extremamente enganosa", afirmou Harris. "Elas não reconhecem que aquilo seja uma forma de propaganda e são extremamente manipuláveis."

O que os pais podem fazer? Com filhos pequenos, a estratégia mais relevante é diminuir o tempo gasto pelas crianças em frente da TV e dos computadores, além do número de mensagens que recebem e o tipo de programa a que assistem. Além disso, quando os filhos pedem alguma coisa, os pais não devem apenas recusar. "Pergunte por que querem aquilo e onde ouviram falar sobre o produto", sugeriu Robinson. Se responderem que viram aquilo na TV ou na internet, "diga que estão tentando vender aquilo para eles. Em seguida, tenha uma boa conversa".

E sobre minha vontade de criar jovenzinhos desconfiados? Embora o pensamento crítico ajude a manter os filhos mais conscientes, Robinson afirmou que contar demais com a ideia de que as crianças sejam capazes de discernir o que se passa nos comerciais poderia servir de argumento em favor das empresas de marketing. "Isso torna as crianças responsáveis por se tornarem consumidores conscientes, tirando toda a responsabilidade das empresas", afirmou.

É importante saber o que seus filhos veem. Assista com eles a seus programas prediletos. Converse sobre o que veem –as imagens em outdoors e "touchscreens", os comerciais de televisão e os site que visitam.

Em um mundo rico em informações, precisamos conhecer as mensagens que nossos filhos recebem, pois assim podemos ajudá-los a compreender o que o mundo está tentando vender para eles.

*Perry Klass é médica pediatra


UOL

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