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quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

O perigoso namoro entre as mulheres e as drogas



Há quase um século atrás, na década de 1920, a American Tobacco Corporation na intenção de dobrar o número de consumidores de cigarros contratou o sobrinho de Freud, Edward Bernays para desenvolver uma campanha de marketing que estimulasse as mulheres afumarem, até então, uma realidade cultural muito distante das mesmas. Associando o ato de fumar à emancipação da mulher na nova sociedade de consumo que ensaiava seus passos,através de um protesto teatralizado durante uma parada comemorativa intitulado “Tochas da Liberdade”, Bernays contratou mulheres jovens e atraentes para invadirem o desfile fumando, segurando cartazes e palavras de ordem associando o ato de fumar à igualdade de gênero gerando a esperada repercussão na mídia da época e dessa forma, a indústria do tabaco ardilosamente conseguiu seu intento, aumentando suas vendas e comprometendo a saúde de todas as gerações que sucederam o embusteiro movimento.

Há cerca de 10 anos atrás, quando comecei a me envolver com as políticas sobre drogadição, tínhamos um cenário semelhante em relação ao uso de outras drogas recreativas por mulheres, de modo geral na ordem de 5 homens para cada mulher usuária de drogas recreativas. Tal diferença de percentual, tal como no passado, tinha como principal fator, questões culturais e comportamentais que determinavam, entre outros, papéis distintos na educação e formação do caráter dos cidadãos e das cidadãs.



Entretanto, já começávamos a identificar os mesmos sinais, ainda que sutis, de mudanças no comportamento das mulheres em relação ao consumo, curiosamente, atraídas pelo mesmo tipo de estratégia torpe das indústrias de bebidas, estética e farmacêutica, obcecadas em aumentar seus faturamentos sem quaisquer maiores responsabilidades sociais, assim como a leniência de governos e da própria sociedade que absorviam essas novas ações de manipulação de maneira displicente, permitindo que avançassem, angariando maiores lucros às custas de toda sorte de prejuízos pessoais e sociais para a comunidade.



Há cerca de cinco anos atrás, quando presidia o Comad (Conselho Municipal Antidrogas) de São José dos Campos-SP, fizemos uma grande pesquisa com quase 10 mil jovens, a metade meninas entre 12 e 18 anos e detectamos um avanço significativo do consumo dessas, em alguns casos, superando o consumo de drogas por parte dos meninos da mesma comunidade, o que nos levou a desenvolver uma série de estratégias que foram devidamente encaminhadas aos órgãos competentes, em especial a prefeitura e secretarias afins, no intuito de conter e reduzir um tendência perigosa que colocava em sério risco às futuras gerações da cidade, vez que o consumo abusivo de drogas por parte de mulheres traz consequências ainda mais devastadoras no desmantelamento do tecido social de uma comunidade, por uma série de razões que vão desde biológicas (mulheres são mais vulneráveis ao álcool por questões fisiológicas como o fato de reterem mais líquidos no corpo) sociais (o uso de drogas está altamente associado à gravidez não planejada; mais de um terço das novas famílias tem na mulher o maior provedor, quando não o único…) estruturais (as redes públicas e privadas de tratamento não estão preparadas para atender mulheres dependentes químicas – no caso de adolescentes o caso se agrava, não havendo em toda região uma só clínica especializada ou adaptada para receber e tratar meninas) e econômicas.



Entretanto, basta um rápido olhar para o atual quadro de degradação, onde o álcool e o crack, associado à prostituição, delitos e toda sorte de violência e vulnerabilidade para entender que a maioria dessas estratégias foram negligenciadas nos últimos 4 anos pelo governo anterior que se ocupou na espetacularização da questão aliada à práticas repressivas que qualquer leigo percebe que foram ineficazes.



Desta maneira, esperamos que o novo governo que se inicia tenha um olhar mais humano e amplo sobre a questão das drogas no município, em especial sobre o vertiginoso crescimento do consumo de drogas por parte de nossas mulheres de todas as idades e condições sociais, tomando providências firmes e eficientes para restaurar a dignidade dessas mulheres e de tantas famílias que sofrem diariamente com esse difícil porém enfrentável problema.



Franklin Maciel

Escritor, Cientista Social e ex-presidente do Comad São José dos Campos

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