Drauzio Varella
Dizem que Deus limitou a inteligência do homem para que não ousássemos invadir seus domínios. Se assim foi, que mal haveria em ter limitado também a ignorância, já que fomos concebidos à sua imagem e semelhança? Custaria?
Faço essa reflexão, porque a Câmara dos Deputados aprovou a liberação da fosfoetanolamina, droga que teria propriedades antineoplásicas, sem que nenhum estudo tenha sido submetido à apreciação da Anvisa, o órgão brasileiro encarregado de avaliar a atividade de medicamentos antes da comercialização.
Seguindo os trâmites burocráticos, o projeto foi para uma comissão do Senado, que só não o aprovou por unanimidade por causa do voto solitário do senador Aloysio Nunes.
A matéria irá a plenário. A julgar pela qualidade da formação científica e pela vocação populista de nossos senadores, teremos no mercado uma droga para tratar seres humanos testada apenas em ratos, conduta repudiada até em medicina veterinária.
Para você, leitor, que não acompanhou essa novela, vou resumi-la:
Um professor de química da USP, em São Carlos, desenvolveu e patenteou o processo de síntese dessa molécula. Depois de documentar regressões obtidas principalmente em ratos portadores de melanoma maligno (em trabalhos bem conduzidos), ele passou a produzi-la em seu laboratório e a distribuí-la a pacientes com câncer.
A distribuição foi feita sem nenhum critério científico para avaliação de eficácia e sem o consentimento dos conselhos de ética da Universidade, passo obrigatório para autorização de pesquisas em seres humanos.
A USP foi conivente com essa aberração durante dez anos. Só quando o professor se aposentou, a Universidade tomou conhecimento daquela anomalia intramuros e proibiu a produção da droga em suas instalações.
Foi um pandemônio. Compreensivelmente, famílias desesperadas entraram na Justiça. Um ministro do Supremo concedeu uma liminar que obrigava a USP a fornecer a droga para um paciente. Veio uma enxurrada de ações legais, que forçaram a Universidade a fabricar um remédio de atividade não comprovada, sem passar pelo crivo da Anvisa.
Na época, fiz uma intervenção no Fantástico, chamando a atenção para esse absurdo. Expliquei que não é essa a forma de descobrir novos medicamentos e insisti em que nunca existiu nem existirá um remédio que cure ou seja útil em todos os casos de câncer, lamentavelmente.
O que chamamos de câncer é um grupo de mais de cem doenças que, em comum, têm apenas a célula maligna. A diferença entre um câncer de próstata e outro de pulmão é tão grande quanto a existente entre insuficiência renal e insuficiência auditiva.
Câncer de mama, por exemplo, é um conjunto de mais de vinte subtipos, cada um dos quais subdividido em outros. Imaginar que uma droga seja ativa em todos os casos, desculpem, é coisa de gente ignorante em medicina.
Fui achincalhado nas redes sociais. As aleivosias mais benevolentes diziam que faço parte de uma conspiração da TV Globo (sempre ela) em conluio com as multinacionais interessadas em boicotar remédios baratos para o povo. Outros afirmavam que cancerologistas, como eu, se opunham à descoberta da cura do câncer.
Fiquei chateado, mas não me senti ofendido, sinceramente. É o preço pago por quem teve o privilégio de estudar num país de iletrados.
Em São Paulo, o Icesp, centro de oncologia de projeção internacional, vai iniciar um estudo clínico para testar a apregoada ação antitumoral da fosfoetanolamina e definir em que tipos de tumores essa atividade poderia ser documentada. Liberá-la por decreto legislativo, além de criar esperanças vãs naqueles que sofrem da doença, cria um precedente grave que desmoraliza a Anvisa e põe a perder a oportunidade de identificar alguma ação antitumoral que a droga porventura tenha.
Tomo a liberdade de sugerir aos senhores senadores que se deem ao trabalho de procurar um único oncologista no Brasil que esteja a favor da liberação dessa ou de qualquer outra droga sem avaliação científica prévia. Seríamos todos nós, que passamos a vida cuidando de doentes com câncer, mercantilistas vis, insensíveis ao sofrimento e à morte das pessoas de quem tratamos?
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quinta-feira, 31 de março de 2016
sábado, 19 de março de 2016
Primeiros testes: "fosfo da USP" não funciona e não é "fosfo"
O pó produzido na USP de São Carlos, encapsulado e distribuído como "fostoetanolamina sintética" para pacientes de câncer, contém no máximo 32% da molécula pura; e essa molécula é completamente inútil, mesmo em testes in vitro, contra tumores de pâncreas e melanoma. As conclusões estão em relatório publicado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, MCTI e que, temo, será ignorado pelas vítimas do verdadeiro culto que se formou em torno da substância, e pelos abutres, de diferentes plumagens, que esperam transformar o desespero dos doentes em votos ou dinheiro.
Os testes que produziram os resultados desapontadores -- mas não inesperados -- foram conduzidos como parte da iniciativa desencadeada ano passado, em resposta ao forte lobby pró-liberação da "fosfo", formado depois que uma combinação de jornalismo irresponsável, pusilanimidade oficial, ignorância e populismo criou o mito de que a a substância seria uma espécie de cura milagrosa para qualquer tipo de câncer. Em plena crise fiscal, o MCTI, nunca o mais prestigiado dos ministérios me termos orçamentários, conseguiu levantar R$ 10 milhões para "acelerar" os testes e a eventual liberação legal da substância.
O relatório do MCTI descreve os resultados da primeira bateria de testes in vitro, nos quais o remédio proposto é inserido no meio de cultura das células tumorais. É importante lembrar que o in vitro é um dos testes mais propensos a gerar falsos positivos, já que, como se diz, é possível matar células de câncer pondo cândida ou detergente no meio de cultura.
Resultado: isolada e pura, a fosfoetanolamina é inútil contra os dois tipos de câncer, mesmo em concentrações absurdamente altas, e quando escrevo "absurdamente" quero dizer: vários milhares de vezes mais altas que as necessárias para obter bons resultados com drogas tradicionais de quimioterapia.
No que poderia ser visto como uma virada irônica, um dos contaminantesda "fosfo" de São Carlos -- a monoetanolamina -- se mostrou tóxica para os tumores testados, mas em concentrações de 7 mil a 70 mil vezes maiores que as drogas tradicionais de quimioterapia. Isso quer dizer que são necessários até 3 litros e meio de monoetanolamina para se obter o mesmo benefício que uma gota de quimioterapia comum. In vitro.
O relatório do MCTI conclui descrevendo as próximas etapas do estudo: teste in vitro da "fosfo" (e, também agora, da "mono") contra células de câncer de pulmão, contra células humanas saudáveis e o início dos testes em camundongos.
Um segundo relatório divulgado pelo MCTI, que testou a toxicidade da "fosfo" in vitro contra células de outros tipos de tumor -- colorretal, próstata, glioblastoma (cérebro) --, também concluiu que a substância não tem efeito, ou só tem efeito em concentrações milhares de vezes maiores que as da quimioterapia comum.
Os autores desse trabalho, no entanto, sinalizam algum otimismo, ponderando que, embora os testes in vitro sirvam para fazer a triagem de moléculas promissoras -- triagem em que a "fosfo", não dá para negar, fracassou -- é concebível que os resultados em cobaias vivas sejam melhores, "possivelmente por depender de rotas metabólicas". É uma esperança talvez admirável, frente o enorme investimento emocional de milhares de pessoas na suposta eficácia da "fosfo", mas fica a questão de até que ponto ela faz mesmo sentido.
O acervo completo de relatórios do MCTI sobre a "fosfo" pode ser acessado aqui.
Fonte
domingo, 13 de março de 2016
Morre Keith Emerson, tecladista da banda Emerson, Lake and Palmer
Keith Emerson, tecladista do Emerson, Lake & Palmer, morreu aos 71 anos, segundo a página oficial do Facebook da banda.
"Com tristeza, anunciamos que Keith Emerson morreu em sua casa em Santa Monica, Los Angeles, aos 71 anos. Pedimos privacidade à família e que o luto seja respeitado", escreveu a banda em comunicado.
O Emerson, Lake & Palmer é um grupo inglês de rock progressivo que lançou o primeiro disco em 1970. Além de Keith Emerson, a banda é formada por Greg Lake e Carl Palmer.
Músicos virtuosos
Contemporâneo de outros grupos do gênero, como Pink Floyd, Genesis, Yes e Gentle Giant, o Emerson, Lake & Palmer tinha músicos virtuosos na formação.
Eles foram precursores na utilização de sintetizadores e na mistura de elementos da música erudita no rock ainda no início dos anos 70.
Fonte: G1
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